Uma vez que entendemos que o Novo Testamento é um livro de judaísmo, precisamos estudá-lo de forma judaica, não de forma Romana, ou Grega.
Um dia maiores obstáculos para alguém interessado no Judaísmo Nazareno é uma frase de Paulo aos Gálatas na qual ele diz:
“Eu, Paulo, vos digo que, se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará. De novo, testifico a todo homem que se deixa circuncidar que está
obrigado a guardar toda a lei. De Cristo vos desligastes, vós que procurais justificar-vos na lei; da graça decaístes.” Gálatas 5:2 a 4
Todo bom cristão já ouviu essa frase e já ouviu também a típica explicação do Cristianismo para ela: “Se você se circuncidar ou circuncidar o seu filho, você está abandonando o sacrifício de Jesus na cruz e procurando se salvar através das obras. Está assim negando, decaindo da fé. A partir de agora, você terá que guardar toda a lei, se errar em um só ítem, já era: perdeu a salvação.””
Essa frase vem como um mantra que nos causa medo, arrepios e dor de estômago! Parece que se circuncidar se isso será nosso fim! Até o terrorista do Hamas pode alcançar misericórdia, mas se você praticar algo que no Antigo Testamento é descrito como o sinal do Pacto de fé com Deus, esse mesmo gesto se transformou numa afronta a Deus e a Jesus Cristo. Como explicar essa metamorfose? Aquilo que representava uma marca da identidade do povo de Deus, virou pecado mortal.
Será que Paulo realmente condenou a circuncisão dos não gentios?
O que será que ele quis dizer com: “está obrigado a guardar toda a lei”?
Será que guardar toda a lei é algo negativo?
Como será que Daniel guardou toda lei morando na Babilônia? Se, como acreditam alguns, na época do VT a salvação vinha de guardar a lei, como será que Abraão, Isaque e Jacó se salvaram?
E Ester, Ezequiel e Moisés que nem ao menos viveram na terra de Israel?
Vamos por partes:
Sabemos que a palavra Lei foi usada por Paulo em vários sentidos. Paulo usou a palavra lei até mesmo para se referir a tendência pecaminosa que existe em nós.
No Judaísmo do primeiro século, a palavra lei, era usada para se referir aos cinco primeiros livros da bíblia mas era usada também para se referir às regras adicionais que eram criadas pelos líderes de comunidades para orientá-las quanto a situações novas, para criar novas regras de conduta em relação a fatos novos que surgiam. Esse conjunto de instruções era chamado de lei.Essa lei não era necessariamente ruim, seria apenas o desenvolvimento natural da história.
Por exemplo: antes de haverem celulares, não havia a regra de se desligar o celular antes de uma apresentação musical. Não existia essa regra porque nem existiam celulares.
Voltando ao texto de Gálatas, Paulo provavelmente estava instruindo aos novos discípulos que estavam chegando a não se intimidarem ante a “polícia da religião” da época. Os tais policiais da religião não seriam os famosos fariseus. Quem deveria estar incomodando os gálatas, seria um braço radical dos essênios que acreditavam em um conjunto de leis de pureza, chamadas “Obras de Lei ” citadas em Gálatas 3:2. Os essênios focaram exageradamente em certas práticas externas e chegavam ao extremo de proibir o casamento e prescrever o isolamento social. Eles mantinham rotinas de extremo rigor asséptico e tornaram-se bons demais para viverem no mundo. Os documentos Q4mmt achados em Qumran, na caverna 4, são os únicos documentos que contém a expressão “obras da lei” , que Paulo usa em Gálatas. Nenhum outro documento de Judaísmo do primeiro século, cita essa expressão.
Os termos “obras da lei” e “debaixo da lei” são termos técnicos usados no primeiro século para descrever um conjunto de leis de pureza que foram mantidas por um braço radical dos essênios que acreditavam que, seguindo duas dúzias de leis de pureza, poderia ser declarados “justo”.
Paulo, que até o final da vida se descreve como judeu, nunca como cristão, escreveu contra essas obras da lei, ou seja, essas leis de puresa que estavam sendo pregadas pelos essênios como sendo o próprio caminho para a salvação.
As leis de pureza ritual da Torah, assim como qualquer outra lei da Torah originais não são erradas, o errado é torná-las como o próprio caminho para a salvação. Neste sentido, Paulo está dizendo: se você colocar um método, um conjunto de regras rituais, por melhor que sejam, em substituição ao sacrifício expiatório de Yeshua, então, neste caso, você está desprezando o principal. Você está perdendo a essência e se voltando para performance vazia, ou até mesmo, voltando-se para uma atitude de soberba. Isso não pode acabar bem. Como estudamos no texto introdutório sobre como se converter ao judaísmo Nazareno, a instrução de Tiago, o líder dos Nazarenos, o processo de conversão seria passo a passo. Imagine um candidato ao judaísmo ter que se submeter à circuncisão no primeiro dia de seu discipulado! Tiago já havia dado as diretrizes. Paulo, que andava de acordo com a liderança dos Nazarenos, não iria ir contra a orientação de Tiago.
Fonte: Rabbi Trimm