Como se converter ao Judaísmo Nazareno?
A maioria das pessoas que perguntam como se converter ao Judaísmo Nazareno, por incrível que pareça, já são convertidas.
Como assim? Como alguém pode ser convertido a algo que ele não conhece?
Vejamos: a maioria das pessoas que começam a se interessar em estudar a Bíblia dentro de uma perspectiva hebraica, já tem o coração voltado para Deus. Elas já amam Yeshua, ainda que o chamem pelo nome que veio da transliteração grega do hebraico, ainda que o conheçam por Jesus.
Quase todos que se apaixonam pelo Judaísmo Nazareno, chegam como por acidente. Seria como alguém que entra em uma casa desconhecida pela porta dos fundos sem saber realmente onde está. Entra na casa com muita cautela, com muito cuidado e começa a explorar o local. Vai caminhando e observando tudo cuidadosamente até que descobre escadas que levam para níveis mais profundos. O andar por onde entraram é apenas o primeiro nível, é o nível mais superficial.
Ao descer as escadas, vão chegando a níveis mais profundos de conhecimento. Um pouco de verdade passa a não ser suficiente. Começa-se a perceber que os degraus que originalmente exibiam pinturas antigas foram tampados por decalques modernos.
Os interessados no judaísmo normalmente já adotaram um estilo de vida que abraça a maioria dos princípios do Judaísmo. Cristãos sinceros normalmente já guardam 90% dos mandamentos da Torah, fora inúmeras regras e regulamentos estabelecidos pelo governo dos países onde moram.
A dificuldade está muito mais ligada ao fato das pessoas terem crescido considerando certos mandamentos de Deus como sendo ultrapassados, do que a dificuldade em obedecer mandamentos per si.
Deus não nos ordenou nada dificílimo ou impossível. Os mandamentos de Deus/Jesus não são penosos ( I João 5:3). Não existe medo de ir para o inferno se não fizermos tudo absolutamente certinho e de acordo com uma lei impossível de se cumprir. Como está escrito no Salmo 130:3 “ Se observares, Senhor, iniquidades, quem, Senhor, subsistirá?
Jesus, nosso maior modelo, nos ensinou a caminhar dentro do verdadeiro Judaísmo. O Novo Testamento é um livro de judaísmo assim como o Antigo Testamento também o é.
O livre exame das escrituras não foi uma pregação inovadora de Lutero. O livre exame das escrituras é um dos pilares do farisaísmo. Ser fariseu não é o mesmo que ser hipócrita. O farisaísmo era um dos tipos de Judaísmo que havia na época de Jesus, aliás, um tipo de Judaísmo bem próximo ao Judaísmo de Yeshua.
A Igreja foi fundada no Monte Sinai e foi avivada em Pentecostes. A Igreja, na sua percepção original, é um conceito judaico.
Quando entramos pela porta, chegamos na nossa casa, encontramos nossa verdadeira família! Fomos enxertados, fomos adotados. Pertencemos à Família de Deus!
Como está escrito em Efésios 2:19 “ Assim, já não sois estrangeiros e peregrinos, mas concidadãos dos santos, e sois da família de Deus,”
O candidato ao Judaísmo Nazareno precisa descobrir sua verdadeira identidade. Jesus, o Jesus judeu, nos convida a segui-lo e, nos convida a aprendermos como ser um bom judeu.
No primeiro século, o Judaísmo Nazareno estava recebendo vários novos convertidos. O crescente número de novatos ao Judaísmo Nazareno era originário de povos pagãos, e teriam muito que aprender! Isso poderia trazer problemas.
Os que vinham do Judaísmo Farisaico, compartilhavam de uma história comum com os discípulos: eles tinham a seu favor anos de leitura das escrituras, entretanto, eles também tinham recebido alguns conceitos falsos que estavam relacionados ao contexto da época.
Esses conceitos errados estavam tão arraigados que foi necessário Pedro, receber um sonho (Atos 10) para entender que ele precisava pregar também aos não judeus. Pedro, assim como os demais discípulos, haviam vivido numa atmosfera de muita dificuldade quanto aos demais povos, Pedro inclusive cita uma das 18 medidas de Shamai (medidas protetivas contra a assimilação/sincretismo) que eram fortes na época.
Quando Pedro, em Atos 10:28 diz que era proibido a um Judeu ajuntar-se ou mesmo aproximar-se de alguém de outra raça, Pedro não está se referindo a Torah, não está se referindo ao Antigo Testamento, ele simplesmente está repetindo um dos 18 editos de Shamai! Em nenhuma parte do Antigo Testamento existe essa regra. Mas, porque havia essa preocupação na cultura da época?
A história judaica é repleta de problemas que o povo judeu enfrentou quando muito próximo a povos pagãos. Não muito tempo antes de Jesus, os Judeus haviam sofrido com o processo de Helenização, ou seja, de assimilação pela cultura dominante, que era a grega. Muitos ficaram fascinados pelo belo mundo grego, cheio de arte, competições atléticas, poesia e filosofia.
No início a dominação grega era mais “laissez faire”, ou seja, mais permissiva. Ptolomeu estava no poder e ele permitia a prática da Tora. O templo e as Sinagogas eram preservados. Ptolomeu inclusive quis que a Torah fosse traduzida para o Grego. Por outro lado, é claro que a influência Grega seduzia o povo para longe do padrão divino.
Essa “harmonia” foi substituída por um ataque aberto contra os valores judaicos quando Seleuco passa a dominar. O irmão mais novo de Seleuco era Antíoco Epifanes IV. Antíoco invadiu o templo, queimou os rolos da Torah, matou um porco no altar do Senhor profanando o templo e dedicou o local ao deus Zeus. Ele crucificou centenas de judeus apenas por eles estudarem a Torah. Antíoco proibiu a circuncisão e quis forçar a população judaica a sacrificar ao seu deus.
Esse estado de coisas conduziu o povo à revolta e levou à Guerra dos Macabeus em 164 a.C., e foi o contexto no qual os discípulos de Jesus cresceram.
Houve reação contra o processo de assimilação e crescente sentimento nacionalista. Esse zelo renovado pela Torah deu origem à circuncisão em massa de crianças que não haviam sido circuncidadas durante o período da proibição. Essas circuncisões compulsórias foram muitas das vezes forçadas. Grupos de judeus zelosos entravam em um vilarejo e circuncidavam todos os jovens e meninos. Esse movimento de pressão e de coação, era provavelmente aquilo que o Novo Testamento chama de Judaizar. Judaizar, poderia ser entendido como essa tentativa de forçar todos os meninos e jovens a se circuncidar. O problema é que esse gesto externo forçado não poderia garantir uma verdadeira conversão, nem dos judeus e muito menos dos gentios que se aproximavam. Os líderes Nazarenos sabiam disso.
Dentro desse contexto, havia diferentes posições entre os Nazarenos sobre como lidar com os crentes novatos vindos do paganismo. Será que eles deveriam ser circuncidados rapidamente? Será que eles trariam seus maus costumes para dentro da comunidade? Imaginem um grupo de pais hoje em dia conversando sobre o que fazer com um jovem recém vindo das drogas que entrasse no grupo onde seus filhos frequentam. Talvez, essa seria uma boa comparação para tentarmos entender melhor a situação. Era natural surgirem perguntas e temores, afinal de contas, eram muitos os que estavam se achegando à família da fé ao mesmo tempo.
Tiago, o líder dos Nazarenos, foi consultado. Tiago explica que o fato dos gentios se voltarem para Deus, era cumprimento das profecias do profeta Amós: “Cumpridas estas coisas, voltarei e reedificarei o tabernáculo caído de Davi; e, levantando-o de suas ruínas, restaurá-lo-ei.” (Amós 9:11/ Atos 15:16)
Entretanto, Tiago esclareceu que ele não endossava a circuncisão automática/forçada dos novos convertidos.
Tiago instrui que, os novos convertidos começassem a guardar algumas regras básicas para que, passo a passo, pudessem ir aprendendo. Eles iam à sinagoga todos os Sábados e seriam instruídos :
“Porque Moisés tem, em cada cidade, desde tempos antigos, os que o pregam nas sinagogas, onde é lido todos os sábados.” Atos 15:21.
Continuando sua explanação, Tiago cita as palavras do profeta Ezequiel quase 600 anos antes (593 a 571 AC). Vejamos: Ezequiel 33: 23 e 26 diz: “Então a palavra de HaShem veio a mim, dizendo: Filho do homem, os que habitam aquelas ruínas na terra de Israel estão dizendo: Abraão era apenas um, e ele herdou a terra. Mas somos muitos; a terra nos foi dada como possessão.
Portanto, diga a eles: Assim diz o Senhor Deus: Você come carne com sangue, levanta os olhos para os seus ídolos e derrama sangue (assassinato). Você deve possuir a terra? Você confia na sua espada, comete abominações e macula as esposas. Você deveria possuir a terra?”
Observe os pecados identificados no texto acima:
1. Comer carne com sangue
2. Praticar a idolatria
3. Engajar em imoralidade sexual
4. Derramar sangue (assassinato)
Continuando nossa análise sobre a resposta de Tiago, vemos que ele busca em dois profetas do Velho Testamento, Amós e Ezequiel, a orientação para os gentios novos convertidos. Tiago diz: “Pelo que, julgo eu, não devemos perturbar aqueles que, dentre os gentios, se convertem a Deus, mas escrever-lhes que se abstenham das contaminações dos ídolos, bem como das relações sexuais ilícitas, da carne de animais sufocados e do sangue.
Porque Moisés tem, em cada cidade, desde tempos antigos, os que o pregam nas sinagogas, onde é lido todos os sábados.” Atos 15:19-21
Tiago cita os mesmos quatro princípios de Ezequiel:
1. Comer carne com sangue
2. Praticar da idolatria
3. Engajar em imoralidade sexual
4. Derramar sangue (assassinato)
Os princípios do Velho Testamento são repetidos no Novo Testamento. Os princípios que foram direcionados ao povo judeu era aplicado para os não judeus que queriam fazer parte do povo de Deus.
Importante observar que Ezequiel dirige sua repreensão aos filhos de Israel, enquanto Tiago dirige as mesmas palavras do profeta Ezequiel aos gentios. O que isso nos mostra? Mostra, que o padrão de conduta que Deus estabelece para o estrangeiro (gentio) e para o natural da terra, ou seja o judeu por nascimento, é o mesmo! Tiago expande o uso das escrituras endereçadas primeiramente aos judeus ao resto da humanidade. Na verdade, Tiago apenas clarifica que esse era o significado original das profecias do Antigo Testamento. Não há novidade alguma nisso. Desde o início, a aliança de fé sempre foi endereçada também aos gentios arrependidos. Não há nada de novo no Novo Testamento.
Os apóstolos não estavam limitando os gentios a quatro éditos específicos e estreitos. Os apóstolos estavam de fato fornecendo o ponto de partida para aqueles que queriam se tornar judeus nazarenos. Moisés teve por muitas gerações aqueles que o ensinavam em todas as cidades, todos os sábados. Os judeus estavam acostumados a ler e refletir sobre a Tora. Os novos convertidos tinham muito que aprender, eles não sabiam ver o messias no Tanakh, não conheciam os princípios da alimentação, não conheciam as festas do Senhor e não sabiam o significado profético que havia por trás de cada uma delas. Os novos convertidos teriam que aprender a ter um coração circuncidado antes de praticar a circuncisão física. Eles deveriam se arrepender e purificar suas ações e corações, antes de poderem passar pelo antigo ritual do mikva (batismo). Em resumo, tinham muito o que aprender antes de se tornarem bons judeus (única religião que existia na época). Desde o início, a aliança de fé sempre foi endereçada também aos gentios. Não há mudança.
De modo semelhante, Tiago usa as palavras de Amós, quando ele fala da restauração do tabernáculo caído de Davi, e mostra claramente que o tabernáculo de Deus iria ser reedificado e os gentios que amam a Deus estariam unidos aos filhos de Israel e sob a liderança deles, como aconteceu em Atos.
Vejamos as palavras de Amós:
“ Naquele dia tornarei a levantar o tabernáculo / cabana caído de Davi, e repararei as suas brechas, e tornarei a levantar as suas ruínas, e o edificarei como nos dias da antigüidade; Para que possuam (suplantem , dominem ) o restante de Edom, e todos os gentios que são chamados pelo meu nome, diz o Senhor, que faz essas coisas.” Amós 9:11,12
Tiago cita as palavras de Amós, para aplicá-las à conversão dos gentios! As palavras dadas aos Filhos de Israel, ao povo original, era estendida a todos que desejavam se apegar a Deus independente da sua origem.
Nesse mesmo sentido de inclusão Paulo diz:
“Pois todos vós sois filhos de Deus mediante a fé em Cristo Jesus;
porque todos quantos fostes batizados em Cristo de Cristo vos revestistes.
Deste modo, não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus. E, se sois de Cristo, também sois descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa.” Gálatas 3:26-29
Conclusão:
Tiago estava fornecendo um método para incluir os gentios na prática da comunidade dos crentes Nazarenos. Esses quatro princípios eram apenas um ponto de partida, em seguida eles poderiam aprender graciosamente os mandamentos do Senhor. Esta é a abordagem de um pai para um filho adotado. A criança natural já aprendeu as regras da casa. A criança adotada tem a oportunidade de aprendê-las. Pergunte a qualquer pai que tenha filhos adotivos e naturais e eles lhe dirão que, no final, um pai justo e sábio garantirá que todos os filhos sejam mantidos no mesmo padrão.